Thursday, February 9, 2012

Faço minhas as vossas palavras!

FAÇO MINHAS AS VOSSAS PALAVRAS!

No silêncio da noite, saiu uma mulher do botequim abraçada a um marinheiro, enquanto o homem de chapéu preto se desviou, para não esbarrar com ambos. "Puta de vida!" - exclamou ela, visivelmente embriagada. Filhos de ninguém, tal e qual como bonecos em ondas de desperdício, pareciam cruzar-se sempre naquelas calçadas portuguesas, sem que os pobres de espírito lhes vislumbrassem destino. Ismael - o homem do chapéu - tinha outra visão das estratégias de atração, a explicação do real parecia-lhe saída de uma página de Dickens...

Passara grande parte da sua vida a estudar e a ensinar, enfiado em bibliotecas, dançando com livros, onde aprendera banalidades... e coisas sérias! Gente era gente, ainda que desconhecida - havia que ter tanto respeitinho com o sr. arrumador como com o sr. administrador. Das longas cruzadas nos livros e das decisões inopinadas que nos fazem correr riscos desnecessários, descobrira pequenos truques para não julgar apenas pelas aparências. Contudo, tinha dificuldade em transmitir essa mensagem aos seus alunos. "Ser professor é, também, sentirmo-nos impotentes!" - sossegara-o um amigo.

Caminhava em direção à sua casa vazia, recordando ser aquele o primeiro aniversário da sua neta. Lamentava não lhe poder contar histórias de vampiros versus fadas, tal como fizera com a filha, mas viviam num país distante. E a banda desenhada - puro deleite! - quem a ensinaria a gostar? Mas não podia partir em viagens ao sabor da vontade, o ordenado e os horários de professor não o permitiam. Lembrava que a sua mulher murmurara "que coisa mais fofa" ao embalar a neta pela primeira vez. Naquela tarde chovia suavemente, mas o mundo parecia gritar: "Sei ser feliz!". Parou por uns momentos junto ao miradouro, como se na voz do Tejo reencontrasse as palavras simples da mulher que tanto amara. O último minuto, antes de qualquer partida, era doloroso, mais ainda quando não tinha regresso. "Vai ser complicado", constatavam os amigos, com solidariedade q.b. E fora! Ainda estava longe de alcançar a praia do esquecimento...

Retomara o passo, mas abrandou ao passar pela montra da livraria. No escaparate, um título prendeu a sua atenção: "Queria rever o teu rosto ao entardecer". Como era verdade! Porém, retomou o seu rumo, não sem se relembrar da frase de outro escritor,"na hora de pôr a mesa, éramos cinco", sendo o número irrelevante - a solidão tem o dom de ecoar em todas as paredes.

Ao contornar a esquina da sua rua, movimentada pelos turistas e pela taberna local, erroneamente apelidada de "Bom Garfo", discerniu o ronco da discussão entre os clientes habituais: "Piegas, a tua tia!" - reclamava um - "Olha aí a palhaçada!" - vociferava outro. O circo estava montado, para gaúdio da turista inglesa que comentara para o acompanhante "I'm lovin it! Very typical!" . Só acontece a quem anda... distraído! - concluíu.

Abriu a porta do prédio, subiu os vários lanços de escada e entrou na casa fria. Vestiu o pijama e, antes de descer a persiana, admirou a lua cheia refletida nas águas do Tejo. "No te digo adiós... te digo hasta siempre!" - sussurrou, fazendo suas as palavras de outros...

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Este selinho, que me foi atribuído pela Landa, será para todos aqueles que descobrirem neste pequeno texto os seus próprios títulos, já deste ano (regras para distinguir os blogues que mais lemos? não quero, nem gosto!):
 

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BOM FIM DE SEMANA E DIVIRTAM-SE!